terça-feira, 26 de novembro de 2013

Reserva não escapa de ação de madeireiros

Flagrante. Pátio ilegal com toras na Resex de Gurupá-Melgaço,
identificado em sobrevoo
Nesta semana, a ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira - possivelmente acompanhada da presidente Dilma Rousseff -, deverá pousar numa vila isolada do interior de Melgaço, no nordeste do Pará, para um encontro com representantes de comunidades agroextrativistas da Amazônia. Se prestar atenção no voo, poderá ver uma série de estradas e clareiras clandestinas que se embrenham pelas matas da região como uma metástase, usada para extração ilegal de madeira.

Nem as unidades de conservação estão imunes ao câncer, como o Estado pôde comprovar na Reserva Extrativista (Resex) de Gurupá-Melgaço, a poucos quilômetros de onde o encontro será realizado.

Para os moradores da reserva, a ação dos madeireiros não é nenhuma novidade. Eles já se acostumaram ao barulho das motosserras no interior da mata e ao trânsito dos caminhões carregados de toras pelos ramais de terra da unidade.

Há quem seja conivente com os madeireiros em troca de dinheiro - R$ 50 a R$ 100 por árvore. Entre as lideranças da reserva, porém, o sentimento é de revolta, com a ousadia dos madeireiros e a inoperância do poder público.

"A reserva está largada à própria sorte", resume o presidente do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Agroextrativistas de Gurupá, Heraldo Pantoja. "As comunidades não têm luz, educação, saúde, transporte, assistência técnica, nada. Aí vem um madeireiro e oferece R$ 50 para derrubar uma árvore, o cara aceita."

Quem se cala diante do problema assiste aos recursos naturais da floresta se exaurindo. Quem se atreve a denunciar não recebe ajuda e ainda corre o risco de ser jurado de morte. "Nossa luta é para manter a floresta em pé. Mas as famílias precisam melhorar de vida, senão, fica difícil", afirma Pantoja.

"Nosso povo é muito vulnerável a qualquer um que chega oferecendo algum aumento de renda", diz Manoel Pena, de 58 anos, uma das principais lideranças comunitárias da região.

Melgaço é o município com pior índice de desenvolvimento humano (IDH) do País, e Gurupá não fica muito atrás. Cerca de 800 famílias vivem na Resex, que abrange 1.450 km² (do tamanho da cidade de São Paulo), sobrevivendo quase que exclusivamente de produtos florestais, como o açaí, o palmito, o pescado e a produção de mandioca.

A presença dos madeireiros na reserva, segundo Pena, é apenas o sintoma de um problema maior e mais grave, que é a ausência do poder público. Com a criação da Resex, em 2006, a expectativa era de que os madeireiros seriam expulsos e que no lugar deles entraria o poder público, trazendo saúde, educação, transporte, energia e assistência técnica, para ampliar a produção e melhorar a qualidade de vida das comunidades.

Nada disso aconteceu. Passados sete anos, a reserva continua a existir apenas no papel.

"O que está em jogo não é só a madeira, é um modelo inteiro de conservação e desenvolvimento sustentável apoiado nas comunidades tradicionais", avalia Danicley de Aguiar, ativista do Greenpeace que viveu vários anos em Gurupá. "O governo criou a Resex, mas não deu o passo seguinte, que é implementá-la. As políticas públicas não chegaram, e isso é muito frustrante para as comunidades."

Soluções. O presidente do ICMBio, Roberto Vizentin, reconhece o problema, presente em outras Resex da Amazônia. "É verdade que existe uma enorme carência de políticas públicas nessas áreas", afirma Vizentin. "Não há nenhum tipo de abstração em relação a isso."

Um plano nacional de apoio ao agroextrativismo, segundo ele, está em fase final de elaboração, com a participação de vários ministérios. Os detalhes deverão ser apresentados às comunidades justamente no evento desta semana em Melgaço - o 2.º Chamado da Floresta, na quinta e sexta-feira.

Uma das estratégias centrais será a abertura de editais para a contratação de serviços de assistência técnica às comunidades, com o intuito de ampliar, agregar valor e garantir a sustentabilidade dos produtos florestais. Outras medidas envolverão a adequação de políticas públicas nacionais de saúde, educação, energia e moradia à realidade dessas comunidades, cujas necessidades socioeconômicas estão sendo mapeadas uma a uma.
O REPÓRTER VIAJOU A CONVITE DAS ORGANIZAÇÕES ANDI E CLUA

Publicado em 23 de novembro 2013http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,reserva-nao-escapa-de-acao-de-madeireiros,1099854,0.htm

Degradação deixa floresta fragilizada e vulnerável ao fogo

Vista de uma clareira típica de desmatamento para plantio de roça. 
A exploração ilegal de madeira é um problema crônico no Pará, Estado recordista em conflitos e derrubadas florestais, e parece estar em recrudescimento, a exemplo do desmatamento, que voltou a crescer em 2013. Segundo o levantamento mais recente da ONG Imazon, 78% da exploração madeireira no Pará é ilegal, e houve um aumento de 151% na área afetada por essa atividade em 2012, em comparação com o ano anterior.
Segundo o pesquisador Beto Veríssimo, o volume de madeira produzido no Estado caiu pela metade nos últimos 15 anos, de 28 milhões de metros cúbicos/ano para algo em torno de 13 milhões. "O problema é que isso ainda é um número muito alto, e tem muita atividade ilegal envolvida nisso", diz.

Diferentemente do desmatamento, que envolve a remoção completa da floresta e pode ser detectado do espaço com relativa facilidade, a exploração ilegal de madeira deixa cicatrizes relativamente pequenas na floresta, difíceis de serem detectadas em imagens de satélite. O impacto ambiental que causa no ecossistema florestal, porém, é imenso. "Quando você anda na mata fica claro que a floresta está muito machucada", relata Veríssimo.

Os buracos abertos no dossel permitem a penetração de luz e o vazamento de umidade do interior da floresta, deixando-a mais seca, mais "rala" e mais vulnerável ao fogo – e à ação do homem. "Áreas com exploração madeireira são fortes candidatas a serem desmatadas no futuro", afirma Veríssimo.

O que fica para trás é uma floresta degradada, que pega fogo com frequência e leva anos para se recompor, segundo o pesquisador Dalton Valeriano, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, responsável pelo monitoramento da Amazônia.

Estimativas. A área total de floresta degradada na Amazônia, segundo Valeriano, pode ser duas vezes maior do que a desmatada. O Inpe só passou a produzir estatísticas anuais de degradação em 2007, por meio de um programa chamado Degrad. Os dados mostram que a taxa anual de degradação caiu de 2007 para 2010, a exemplo do desmatamento, só que com áreas degradadas sempre maiores do que as desmatadas.

Publicado em 23 de novembro de 2013
http://www.estadao.com.br/noticias/vidae,degradacao-deixa-floresta-fragilizada-e-vulneravel-ao-fogo,1099863,0.htm

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Coomflona organiza loja com produtos certificados


A Cooperativa Mista da Flona Tapajós (Coomflona) prepara para o dia 6 de dezembro um grande evento para inaugurar a Ecoloja Tapajós, que terá produtos confeccionados a partir de galhos e madeira maneja -ambos certificados pelo selo FSC. A programação prevê também a assinatura de termo de parceria entre a Cooperativa e o Instituto Floresta Tropical (IFT), Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB) e Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa).
Na ocasião a Coomflona receberá formalmente o selo de Certificação FSC 100% comunitário, que foi alcançado após uma série de auditorias que analisou aspectos sociais, ambientais e econômicos relacionados a nove princípios do FSC no padrão Slimf (em inglês, Small and Low Intensity Managed Forests). As auditorias foram conduzidas pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) e envolveu entrevistas e visitas técnicas ao longo do segundo semestre de 2013.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

O longo caminho da regularização das UCs de uso sustentável

Vanderleide Ferreira é filha de seringueiros e conhece bem a vida dura dos extrativistas que vivem em comunidades isoladas no Amazonas. "Meu pai era escravizado, meus avós foram escravizados", lembra a liderança comunitária sobre o regime de escravidão por dívida, uma prática da época da exploração da borracha ainda presente na Amazônia: Os "Patrões" que se dizem donos de terras de antigos seringais obrigam os ribeirinhos a pagar-lhes a "renda" – uma parte da produção da família que é retida como forma de pagamento pelo uso da área.
"Fui muito revoltada com a situação dos patrões dentro da nossa área", conta Vanderleide, que iniciou, junto com outras lideranças, a luta pela criação da Reserva Extrativista (Resex) do Rio Ituxi, no município de Lábrea, no Sul do Amazonas. Da primeira carta enviada ao governo federal em 2000, até a assinatura do decreto, foram oito anos de luta. "A reserva foi decretada, mas nossa batalha continua", explica. Depois da criação da reserva, os moradores do Ituxi esbarraram no primeiro obstáculo para a implementação da unidade de conservação: a regularização fundiária.

A Reserva Extrativista Médio Purus, também no município de Lábrea, foi decretada em 2008 e teve um processo de criação semelhante ao da Resex Ituxi. "Caminhamos juntos, as propostas nasceram na mesma época e nós formamos grupos para atacar a mesma situação", explica José Maria Ferreira, presidente da Associação dos Trabalhadores Agroextrativistas do Médio Purus (ATAMP).

"Dentro da nossa área ainda tem terras onde o patrão obriga as famílias que moram ali a pagarem renda," denuncia José Maria, que sofre ameaças de morte desde 2008, quando foi criada a RESEX. Ele explica que "o seringal Lusitânia é uma área com potencial de manejo de castanha e os extrativistas são obrigados a entregar 20% da produção para os patrões por utilizar a área".

As práticas de manejo comunitário de recursos naturais contribuem para o estabelecimento de iniciativas que aliam desenvolvimento social e conservação ambiental. As populações tradicionais da Amazônia desenvolveram, ao longo dos séculos, modos de vida particulares com grande dependência e profundo conhecimento dos ciclos naturais e biológicos e sistemas de manejo para manutenção da biodiversidade.

Manoel Cunha, ex-presidente e atual diretor de finanças do Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS), explica que existe uma demanda enorme de comunidades que precisam de liberdade para usar os recursos da floresta de forma sustentável para a garantia das suas futuras gerações: "A regularização é essencial para nós".

Com o documento da terra, os extrativistas têm maior facilidade para acessar a políticas públicas como o Programa de Apoio à Conservação Ambiental Bolsa Verde.. Lançado em 2011, concede benefício às famílias em situação de extrema pobreza que vivem em áreas consideradas prioritárias para conservação ambiental. O programa visa reconhecer e compensar comunidades tradicionais e agricultores familiares pelos serviços ambientais que prestam à sociedade.

Publicado em 05 de novembro de 2013
Veículo: http://www.oeco.org.br
Leia na integra: http://www.oeco.org.br/reportagens/27739-o-longo-caminho-da-regularizacao-das-ucs-de-uso-sustentavel